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terça-feira, 23 de abril de 2019
Cuidado com aquela mulher
Cuidado com aquela mulher estranha na rua.
É louca, dizem.
Não aceite doces na rua.
É muito perigoso.
Quando o sangue escorre da tela.
Em doses regulares todos os dias.
E as vezes por baixo da porta.
Acho que é por isso que as senhoras nos bairros
Aguam suas plantas e calçadas pelas manhãs.
E é por isso que a gente se esquiva tanto
Daquilo que tem medo de escrever.
Cuidado com a velha louca.
Não saberia dizer se foi no século vinte
Ou vinte um, que lhe deram a alcunha.
Tampouco fazia diferença.
Não lembrava ao certo quando fizera versos
Quando ria nos bares
Ou se teve amantes.
Tudo ao certo tinha desaparecido
Deus resetava a memória dos velhos por misericórdia.
Excesso de lembrança e passado
Deixava o rebanho agitado.
Nos querem dóceis.
Frágeis
Magras
Rosadas.
E se loucas ou depressivas
Nos querem calmas.
Jamais histéricas
Dramáticas
Exageradas.
Também já tinha esquecido quando chegou a loucura
Se foi na menopausa, adolescência ou puerpério.
Ou no festival que fora em 2007.
Ou se fora quando não aprendeu a ficar sozinha
E ficou.
E se foram anos e dentes e amores
E dizem, louca;
Ela nunca superou.
Quando em desespero
Esvaziava as tripas
Do medo de não caber
Lhe impuseram bem cedo
Trate de emagrecer.
E desde cedo acostumada
Que pra poder ser amada
Ou mesmo considerada uma pessoa
Tinha que merecer.
Também não lembrava quando as duas opções possíveis
(viver numa bolha com respiração artificial que pode ser cancerígena a longo prazo ou ser intoxicado, incinerado pelo que houvera sido um buraco em uma camada de ozônio e só sobrou o buraco)
Não eram mais opções possíveis.
Ela esqueceu e já não desenhava suas flores favoritas.
Quando o amor se confundiu com medo;
Esqueceu os passos apertados
Nas horas tardias.
Quando apertado em seu pescoço
O silêncio quase conseguiu sufocá-la.
Quase, eu disse, quase!
Pois ainda que louca e esquecida
Ela não deixa os outros dormir.
Dizem que grita na rua
Até ser contida pela força policial
Metida a força
No camburão
Na camisa de força
Metida
E a força.
Com sossega leão
Com choque
E estupro corretivo.
Pra aprender o seu lugar.
Carolina Verissimo
terça-feira, 9 de abril de 2019
Subversiva
Eu me orgulho em ser ofensa
Ao seu senso de beleza sigo sendo insubimissa
Ese já se chocou não viu um terço dessa missa.
Eu rimo com 100 quilos de peso
Ainda que me animalize, ridicularize.
Vem e me chama de louca pra baixo.
Que se a sanidade mental
Exige que eu use seu espartilho moral,
Eu saio sozinha desfilando minha loucura.
Destes Dias
Estava com cinco, seis,sete ou oito poemas engasgados.
E fazer poesia poderia e era a maneira que eu encontrava de desobedecer, destoar e dizer que eu não concordo com nada disso.
Eu ando enojada, desesperançosa e triste.
Todos os dias o vazio metálico no olhar das pessoas está mais próximo.
Qualquer dia me engole.
Qualquer dia me alcança.
Eu não sei nadar em desespero.
Parecia mesmo um pouco de exagero.
Cai.
Levanta.
Cai na choradeira.
Já não tem mais força.
É tarde e está sozinha.
Aperta o passo ,a chave e a fé entre os dedos.
Carolina Verissimo
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